domingo, 12 de outubro de 2008

RESENHA

SCHÖN, Donald A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000


A procura por obras que nos ajudem a refletir sobre a prática transforma o profissional em educação em verdadeiros “garimpeiros” de bibliotecas. Essa “garimpagem” quase sempre se dá por obras que realmente demonstrem de forma clara e que esteja diretamente ligada à educação e ou a sala de aula. Mas esse não é o caso do livro “Educando o Profissional Reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem”, no qual o autor Donald Schön procura demonstrar a “reflexão-na-ação” através da arquitetura. Pode até parecer um pouco estranho trabalhar um tema como esse através de algo pouco conhecido para os educadores: “projeto arquitetônico”.

O autor utiliza de diálogos travados nas aulas de arquitetura entre instrutor e estudante para demonstrar a importância do refletir no fazer fazendo. À medida que se começa a entender os “diálogos”, o leitor passa a compreender a força do “pensamento arquitetônico” para a “reflexão-na-ação”. O perguntar, o responder, o fazer novamente, o explicar o feito, terminam por ser o resultado dessa reflexão facilitada pelo pensar arquitetonicamente. Essa metodologia adotada por Schön, em toda a extensão de sua obra, os diálogos ou parte deles, parágrafos sínteses de conversações entre instrutor e estudante, a reflexão acerca desses, possibilitam ao leitor uma leitura marcada pela compreensão da reflexão sobre a prática, facilitando assim, o estabelecimento de relação da teoria com a prática, encurtando então a distância entre esses dois pontos tão polemizados nessas últimas décadas


Nesse século do conhecimento, no qual, o refletir sobre o fazer “enquanto se faz”, o livro de Schön faz-se necessário nas mais diversas esferas do profissionalismo, seja ele, público ou privado. Fazer e fazer bem feito, é o resultado da reflexão sobre a prática em todas as suas dimensões. A mestra em educação, professora Ângela Paiva, faz uma alusão muito pertinente em seu livro “Educadores Reflexivos: escola feliz”, cabendo aqui destaca-lo por demonstrar a importância que é o livro “Educando o Profissional Reflexivo” para nós educadores: “(...) nós professores, nos artigos de Schön, somos convidados a desenvolver a capacidade reflexiva sobre nossa própria prática, fundamentando o conceito de professor reflexivo”. (2003, p.16)

O livro está dividido em quatro partes e essas se dividem em capítulos. A parte 1 “Compreendendo a Necessidade do Talento Artístico Profissional”, composta de dois capítulos. Nessa parte, o autor procura despertar o leitor para a necessidade da observação de um determinado problema, em busca de uma possível solução, na qual, sua análise será feita a a partir de fatos observados.
Nos capítulos 1 e 2, o leitor é estimulado ao desenvolvimento de habilidades em investigação e pesquisa, como sendo imprescindíveis fomentadores de situações-problema apontados na prática. Ainda nesses capítulos, temos a atenção voltada para algo que muitas vezes nos passa despercebido, que é a questão quanto a tomada de decisões sob condições de incertezas – que como disse ele – “que é o que não sabemos, e, mais uma vez percebe-se que o incentivo à prática reflexiva através de um projeto arquitetônico torna-se mais motivador do que se possa imaginar, talvez porque, a linguagem usada pelo autor por si só, já é um incentivo à reflexão. Linguagem do tipo “virando o problema de cabeça para baixo” já nos instiga a pensar sobre/no “fazer fazendo”

A parte 2 “ O Ateliê de Projetos Arquitetônicos como Modelo Educacional para a Reflexão-na-ação”, contendo cinco capítulos é um convite para que seja apreciada a exploração de uma “conversação reflexiva do design com seus materiais no contexto da elaboração do projeto de arquitetura”. É uma viagem onde o “vai-e-vem” do dialogo “zigzagueia” por entre os diálogos travados com instrutor e estudante. Nessa interação, observa-se que, o quanto é imprescindível que se conheça e que se saiba o que cada um está falando. Esse conhecimento de “zonas” é interessante para que o dialogo se torne em reflexão da prática. Quem pergunta precisa conhecer o que o seu interlocutor esteja fazendo, como está pensando para que os questionamentos possibilitem a reflexão-na-ação, é o pensamento arquitetônico colocado em favor da reflexão. É o próprio Schön quem afirma isto quando diz: “cada ação é um experimento local que contribui para um experimento global de reconstrução da concepção do problema”. (p. 55)

Esse diálogo entre instrutor e estudante impulsiona a uma cadeia de possibilidades que provocarão por sua vez a tessitura de uma “teia de ações”. Tudo isso possibilita, segundo o autor, a entrada do estudante no seio do problema, impondo seus próprios conceitos. Assim, para Schön, o “mostrar e o dizer do instrutor estão entrelaçados da mesma forma que o ouvir e imitar do estudante”. (p. 93)

A compreensão sobre esses pontos destacados, nos possibilita uma maior apreciação dos capítulos 3, 4, 5, 6, e 7 e conseqüentemente, maior vantagem se tirar da sua leitura:
· Prestar atenção à presente interação como um objeto de reflexão em si;
· Entrar em contato e descrever seu próprio processo, bastante tácito, de conhecer-na-ação;
· Refletir sobre as idéias que o outro tem do material substantivo que o instrutor quer transmitir e o estudante quer aprender;
· Testar o que se entendeu sobre o processo de conhecer-na-ação do outro e sua concepção da interação. Testar o que o outro fez de nossas tentativas de comunicação.
· Refletir sobre as teorias-em-uso interpessoais trazidas ao processo comunicativo.

“Como Funciona o Ensino Prático Reflexivo: exemplos e experimentos”, título da parte 3, formada por três capítulos. Schön, procura nos capítulos 8, 9 e 10 demonstrar o que se chama de “teoria da ação”. “Aprenda o que você já sabe fazer, para que possa escolher o que irá querer fazer” é a frase de ordem para que os estudantes sejam conduzidos ao ensino prático reflexivo. Mais uma vez o autor procura evidenciar a importância do conhecer-na-ação. Nessa parte do livro, o profissional é visto como um produtor de projetos, visto como um executor do conhecimento-na-ação, incluindo nesse ato, a capacidade de “construir o design” de sua execução.

Na última para da obra, Donald Schön destaca-a com este título sugestivo: “Implicações para o Aperfeiçoamento da Educação Profissional”.
Nos capítulos 11 e 12, assim como, nos demais capítulos anteriores, os dois últimos não poderiam de forma alguma, serem desviados do objetivo inicial do livro: a reflexão. A reflexão-na-ação foi o inicio e a reflexão sobre a reflexão-na-ação é o incentivo explícito na parte final. “A fenomenologia da prática – a reflexão sobre a reflexão-na-ação da prática - deveria entrar no ensino prático por meio do estudo da vida organizacional dos profissionais” (p. 234)

O exercício da reflexão sobre a prática, possibilita ao profissional fazer intervenções adequadas e nos momentos oportunos e isso certamente o levará a estudar e pesquisar sobre a sua própria prática.

Para não “ser tão diferente do normal” o último capítulo da parte 4, retrata fatos que se assemelham a realidade da educação hoje: novas mudanças, a coletividade em prol do sucesso, currículo ousado. Os desafios e os questionamentos até parecem com os que acontecem agora. Como em toda a extensão da obra, Schön, outra vez acertou ao usar “falas” em seu livro, e a seguinte, demonstra de forma simples até parecendo um “eco” do que se discute nas instituições educativas hoje. “(...) pessoas sentadas em torno de uma mesa, realmente questionando a forma como poderiam ensinar melhor”. (p. 243)

A cada página do livro, surpreende-se, pois até parece que o autor faz uma “leitura” do pensamento do educador. É por demais empolgante e motivador, além de prazeroso, ler aquilo que cada um está vivendo, para o qual procura resposta. Tentar perceber a sutileza contida em cada frase, e ou palavra nos induze a um caminho de reflexão sobre a reflexão-na-ação. Tentar se contagiar e trazer essas afirmações para o cotidiano, será a vontade de qualquer leitor que deseja educar-se enquanto profissional reflexivo:
“Tomar dados brutos e produzir algo sensível”.
“Escrever claramente sobre questões complicadas”.
“Lidar com pessoas que vêem o mundo de forma muito diferente e fazer com que algo aconteça”.
“Ser capaz de passar por questões interpessoais e políticas difíceis e manter-se fiel a idéias importantes”.
“Ser capaz de lidar com pessoas que discordam de você de uma forma produtiva”(p. 244)

As últimas páginas do livro, a angustia por experimentar um currículo novo, é mostrada de maneira quase poética, onde algumas vezes, a realidade do ambiente sobre o qual o livro foi escrito, e a realidade do leitor se misturam de modo que encontrar ou identificar cada uma fica muito difícil.

É a realidade da realidade vivida pelo educador, sendo “escancarada” pelo autor onde a reflexão é incentivada não só para o início da carreira profissional, “mas no decorrer dela de modo contínuo” (p. 249). São 250 páginas de profundo entusiasmo para todo aquele que vive a “garimpar” em busca da fortuna do conhecimento, acreditando que o mapa do tesouro é o currículo. Nessa jornada, em companhia de Schön, acontecerá com o leitor o que acontece com qualquer “garimpeiro” persistente: “o contágio”. É por contágio que a motivação e o encorajamento irão acontecer para que se possa “mergulhar de cabeça” nessa viagem para que se possa tornar um profissional reflexivo em busca do desenvolvimento do ensino prático reflexivo.

Um comentário:

Maria Jose Sales disse...

BEM DIDÁTICO. AJUDA MUITO A COMPREENDER MELHOR A OBRA DE SCHON...